Tuesday, May 10, 2005

já fui brilhante

Esta manhã dei por mim, a caminho do escritório, a constatar que “já fui brilhante”. Mas já não sou. Já não sou mais. Tive a porra de uma entrevista telefónica com o director de qualquer coisa semelhante ao “Internal consultancy department” de uma das maiores multinacionais do planeta, uma mesmo do top30 do ranking Business Week 2004, para uma posição daquelas que devem dar mesmo pica – reporting directo a nível do VP, interacções por essa Europa fora e nos States, package até 55kGBP, etc. Pois, como está bem de ver durante os 30 minutos de tempo de antena, parecia um borrego afectado por encefalopatia espongiforme. Enrolei o meu inglês todo, disse duas ou três banalidades e cheguei ao final a desejar que o suplício terminasse rapidamente. Já no outro dia, quando decidi rever os brilhantes reports que produzia há uns anos atrás, tinha tido esta estranha sensação. Hoje em dia, praticamente não sou capaz de produzir nada de verdadeiramente útil sem me inspirar em coisas que fiz (ou outrem fez) no passado e recorrer ao “copy-paste”. Sou um zero à esquerda. Acabou-se. E se me vou safando em estilo é porque ainda sou um “favorito da fortuna”, i.e., a sorte protege-me. Mas porquê? Na escolinha primária era tão bom que me dava ao luxo de ser “distraído” – pelo menos é o adjectivo que me ficou das cadernetas escolares e até servi de case-study a uma grupeta de psicólogos estagiários. Até ao 9º ano, era, em parceria com outro Ricardo, o 2º melhor da turminha – quase tudo cincos e despreocupado porque achava a “número um” um encanto. Do 10º ao 12º mantive-me nos 20% do topo – os outros eram mais ou menos nerds (sorry folks!) excepto a minha namoradinha. Entrei para a universidade sem muito estudar e ainda assim com 15 pontinhos de margem – é certo que contando com 6 da bonificação. Por lá me arrastei em desespero – quem maus hábitos cria… E depois, viva o mercado de trabalho: desde que se goste disto, é sempre a subir e viva os aumentos chorudos. Mas a verdade é que o brilhantismo se perde por volta dos 27 – como demonstrado no Pravda do capitalismo moderno:

Bom, no caminho para casa tive um assomo do brilhantismo perdido e decidi escrever ao senhor entrevistador – que ainda para mais era excepcionalmente simpático – a destacar as excelentes capacidades – que já não possuo – e que o devem convencer a contratar-me. Pois, como diria o outro: “Alea jacta est”.

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