Tuesday, January 11, 2011

romance

Tenho numa prateleira do meu quarto, um guerreiro de terracotta que me trouxeram há uns tempos de Xi’an. Reprodução fiel do exército a que pertenceu, guarda-me uns quantos Moleskine que fui inscrevendo ao longo da vida e faz companhia ao “A Montanha da Alma” (Gao Xingjian) que foi o único romance made in China que já me atrevi a ler. Recordo-me que é uma história de viagens. Abro-o ao acaso e sai-me um capítulo perfeito, adaptável, e decido adaptá-lo ou adoptá-lo:

“Encontraste-a junto ao hotel. Era uma expectativa difusa, uma esperança vaga, um encontro fortuito, inesperado. Ela aparece-te e tu não podes deixar de a olhar. Ela sobressai bastante do habitual: a sua silhueta, a sua atitude, o seu ar perdido. Olhas para ela e começam a rir os dois. Era este sorriso que esperavas.

- Entramos? Encontraste qualquer coisa para dizer. Começas a conduzi-la contornando as mesas. Escolhem umas poltronas cheias de espaço e ficam mal encostados.

Sentes um perfume subtil que trespassa todos os outros. Emana dos seus cabelos, emana dela.

[…]

- Sinto-me um pouco constipada

- Sentes-te mal?

- Não, já está melhor.

[…]”

E o diálogo discorre, praticamente perfeito, sem pressas e sem ansiedades de porvir. E tu sabes, pelo teu sorriso aberto, que já não pretendes esconder, que está ali, diante de ti, alguém que vais amar intensamente. Então descobres que o brilhante da felicidade não está no ser amado, isso já havias experimentado, mas sim no gostar de alguém assim. Então, não te interessa a história, não te importa o passado, sentes-te temperado, robusto e convicto de que é ela que queres.

“- Gostas disto?

- Sim.

- Não achas que é maravilhoso?

- Não sei, não posso dizer isso. Não mo perguntes.”

A magia dos bons romances é esta capacidade de se deixarem adaptar, adoptar, como se neles pudéssemos encaixar partes perfeitas da nossa vida, imaginadas e escritas por outros mas que têm tudo a ver com a nossa realidade.

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