Wednesday, November 9, 2011

Das (o)posições – filosofia de ponta…

Gosto da diversidade humana. Se o mundo fosse mais perfeito do que já é, encontraríamos ao longo da vida muito mais pessoas capazes de nos despertarem para além do simples facto e da constatação de que estamos vivos dia-a-dia. Viver, a sério, é a faculdade de sentirmos que está ali, mesmo diante de nós, alguém inequivocamente diferente e que nos transporta para uma dimensão paralela daquela em que vivemos fisicamente.
Hoje faltava-me um fusível. Literalmente, faltava-me o fusível para ligar, no carro, o carregador do GPS sem o qual ainda me vou perdendo nesta cidade grande. Saí à hora do almoço e procurei em vão um concessionário do bólide que me foi entregue, dando a volta a uns dez quarteirões sem encontrar a maldita casa da Chevrolet e virando selectivamente à direita para evitar perder-me. Finalmente, farto da procura decidi experimentar o da FIAT (Fabbrica Italiana Automobili Torino), onde entrei e fui recebido por um vendedor de barriga protuberante e aperto de mão caloroso, provavelmente encantado com o sujeito devidamente engravatado que lhe poderia comprar mais um carrito e proporcionar um bónus adicional a tempo do Natal em família. Puxei do fusível estragado do bolso e ele percebeu que não vinha ali negócio, mas abriu um sorriso rasgado e indicou-me onde encontrar a peça, umas quantas quadras mais à frente. Quando eu já lhe voltara costas, agradecendo a informação, chamou-me e disse-me “Cara, vai ali na frente e procura pelo Alexandre!”. Eu agradeci novamente e atravessei a rua. Encontrei o dito, num pequeno barraco com as mãos mergulhadas em óleo e no motor de um carro de capot aberto. Sorriu para mim com uma expressão de paz-na-alma absolutamente única, enquanto eu lhe mostrava a peça de 20 Amperes e perguntou-me: “Quantos você quer?”. E eu: “Um basta. Não, melhor se forem dois.” Ele mergulhou no interior do barraco feito oficina e reapareceu com os dois pedacinhos de plástico, oferecendo-mos de graça quando eu lhe perguntei quanto era. Agradeci-lhe com sinceridade, pensando na dicotomia entre o eu de fato e engravatado, e o sujeito generoso das mãos cobertas a óleo, atravessei a rua em sentido contrário e instalei o fusível novo para me orientar o GPS e o caminho de volta à minha vida.
Durante a tarde e até agora, lembrei-me daqueles dois sorrisos abertos e atenciosos, baralhando-os com as posições da vida e com os sentidos opostos que esta pode assumir.

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