Conduzi-nos pelas estradas da montanha mágica até ao lugar
quase secreto onde só levara duas ou três pessoas especiais. À beira da água,
que batia de forma suave contra os pilares de madeira, pedimos um robalo
grelhado não escalado, com a certeza de que era de mar, umas amêijoas e uns
perceves, de que ela gostava e que eu não aprecio. O sol ameno não nos
perturbava o diálogo:
- Em que estás a pensar?
- Sabes, descobri há uns dias que os meus pulsos guardam
memórias.
- Guardam memórias, como!?
- Sim, guardam memórias sob a forma de cheiros acumulados.
Já experimentaste cheirar os teus pulsos?
- Não. Deixa-me ver… Cheiram ao perfume que pus hoje de
manhã…
Debrucei-me sobre a mesa, estendendo os braços, primeiro o
direito e depois o esquerdo.
- Humm, experimenta os meus.
- Ah, cheiram bem mas não a perfume, principalmente o esquerdo.
Não reconheço o cheiro, quais são as memórias que te trazem?
- Bom o direito, cheira um bocadinho a cânfora do gel que
lhe pus por estar aberto, mas o esquerdo tem, definitivamente, o cheiro do meu
último amor.
- Ahahah, tu e o teu romantismo… tens-te esquecido de passar
aí o sabão!
- Não. Tem o cheiro bom dela impregnado e não há lavagem que
resulte.
- Até te voltares a apaixonar…
- Eu não quero.
- Olha, come mas é uns perceves.
- Obrigado. Eu não quero.
Estávamos nesta troca de palavras, quando o sol abriu
e chegou o robalo… delicioso.
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