De cada vez que se sentia perdido, sentava-se no banco do
jardim e escrevia uma história de amor que levava apenas até ao ponto certo em
que nenhum dos personagens sofreria as consequências do que sentia. Era, com
toda a certeza, um escape para o mal de que padecia e para a sensação da
brevidade dos tempos de felicidade que não era capaz de ultrapassar. Não
suportava o diálogo que o seu coração travava com a alma em surdina e, por
vezes até, em silêncio. Não acreditava nas impossibilidades que lhe expunham num
argumento de história finita. Acreditava sim, na transparência dos sentimentos
e das sensações que observava sentado no banco do jardim.
Naquela tarde saiu-lhe o par das bicicletas e sorrisos
abertos sob um sol fantástico de Dezembro em Lisboa. Viu-os circundar o jardim
lado a lado e em fila-indiana feita de apenas dois, por entre a calçada branca.
Viu-os contentes com o fim-de-tarde a experimentarem a “acrobacia” de pedalarem
de mão-na-mão. Viu-a cair sobre a relva verde-bonito e bem-cortada a esboçar um
beicinho enquanto ele desmontava apressado da “bicla”. Viu-o debruçar-se sobre
ela, preocupado, enquanto ela fazia um sorriso maroto de quem queria meiguice. Viu-lhes
o abraço recuperador, quando ele a erguia como o melhor da sua vida. Imaginou-lhes
a história simples e certa de quem encontrara a alma-gémea quando já não
acreditavam muito. Foi, novamente, capaz de compreender que existem momentos,
situações e lugares onde o presente se realiza sem receios do que aconteceu
antes, porque faz todo o sentido.