O português fora de portas, fora do país, é absolutamente,
naturalmente, consequentemente e essencialmente um tipo bestial. Transtorna-se
e transforma-se para ser do melhor que há. A razão comparativa nem sequer chega
a ser excepcional. Lembro-me de uma viagem à Suíça, ainda miúdo, em que encontrava
um português em cada restaurante, em cada hotel, a servir à mesa e a tratar dos
quartos: simpáticos, orgulhosos, briosos, atentos, preocupados com o
“promenor”, cheios de objectivos e de capacidades de que não somos capazes no
rectângulo bafejado pelo bom tempo e pelo ar saudável do Atlântico. Está-nos no
desoxirribonucleico, só que ainda ninguém identificou o aminoácido certo para
combinar o dom com o ponto geográfico da pátria. Se até há algumas décadas a
coisa se justificava pela falta de investimento no cantinho lusitano e na
necessidade de ir para fora “vencer”, hoje em dia tudo isto me surpreende. Um
espanhol fora do país é um aproveitador. Um francês fora do royen é um maçador.
Um inglês junto a uma praia é um bêbado de faces rosadas. Um alemão fora do
reich é um perdido de sandálias e meias azul-bebé. Um americano fora da
homeland é um erudito pretensioso (*). Já um português fora da lata de
sardinhas é um vencedor, a sério. E isto faz-me subir a mostarda ao nariz.
Portugal está no top5 dos países que conheço. Tem tudo (menos petróleo), campos
bonitos, praias como não há iguais, floresta mediterrânica, solos onde o que
cresce é tudo de qualidade, uvas para bom vinho, amêndoas deliciosas, azeite premium
que exportamos, tudo sem a “doença do holandês” e no entanto estamos onde
estamos, isto é, parados no tempo. Enraizados na fábula de que vivemos em crise
pelo menos desde 1822, quando se acabou o Reino Unido de Portugal, Brasil e
Algarves. Cá fora somos os maiores, em absoluta contradição com o que (não)
conseguimos ser lá dentro. Cá fora somos orgulhosos, criativos, capazes e até
engenhosos. Adaptamo-nos, desfrutamos e damos o que temos de melhor. Cá fora, é
tudo muito “fixe” e até parecemos um povo com inteligência colectiva. Há mesmo
um sentido de fraternidade que se estende além-mar com carinho desejado para a
nação que não nos viu ser do que somos capazes.
(*) Estendendo isto à nova ordem mundial – Um chinês é
um mete nojo fora do restaurante. Um indiano é um chato monumental. Um russo é
um tipo que fala sem parar. Um brasileiro é um gastador enfatuado.
1 comment:
É um facto... e cá fora somos uns portugueses saudosos ansiando pelo regresso (mesmo que temporário) ao jardinzito!
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