Gosto imensamente de alguns personagens que cruzam a minha vida. Não sou um animal de hábitos mas fora algumas temporadas passadas no estrangeiro, vou ao mesmo barbeiro desde que deixei de deixar que me cortassem o cabelo à tigela. O local é conhecido como o barbeiro dos engenheiros (o que me assenta bem) e é uma daquelas barbearias tradicionais que ainda existem em Lisboa, e onde alguns dos ditos ainda vão mesmo fazer a barba. O meu barbeiro dá pelo nome de Jorge (nome que lhe assenta na perfeição) e é um personagem. Para além de tratar das melenas de algumas cabeças de IQ superior, é um audiófilo convicto. Daqueles que alugam salas de som, para ouvir o som cristalino do último vinil, tomam beberagens de filtros para apurar o ouvido e não acreditam na fidelidade do CD quanto mais do mp3. No tempo em que ainda se compravam Hi-Fi systems (i.e., antes do advento do Wi-Fi e das músicas partilhadas em bytes) foi ele quem me recomendou a bela Denon D-M7S cá de casa à qual ligo o Pod (shame on me, sou um herege). Invariavelmente, quando vou cortar o cabelo (situação em que a maior parte dos homens troca conversa de circunstância sobre bola com o seu barbeiro) eu e o Jorge trocamos ideias sobre as últimas tecnologias do bom som, ele informa-me sobre o último vinil que comprou, sobre a pureza da voz da Ella Fitzgerald ou, intelectualmente, sobre o estado da arte dos últimos tenores portugueses, porque é um apreciador de ópera. E eu adoro o privilégio, e orgulho-me por ser um dos clientes de um barbeiro com uma paixão destas, que verdadeiramente aprecia o Barbeiro de Sevilha.
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