Tuesday, January 31, 2012

No Reino do Abacaxi | 3

Deixou-se ficar quase uma hora debaixo do chuveiro com a água quente a escorrer-lhe sobre as costas, enquanto pensava o que queria daquele encontro. Se fosse até ao fim, aquela seria a sua primeira traição ao que sentia, e sabia de antemão que isso iria deixar desmanchado o que queria para a vida. Quando saiu debaixo da cascata, decidiu que queria escrever-lhe uma carta, com as palavras doces que sentia por debaixo do peito:
“Meu Amor,
O que despertaste em mim não parece ter fim e prolonga-se para além das estrelas que cada dia vejo passar no céu sobre a iluminação desta cidade. O que eu sinto é maior, mais completo do que a matéria lamechas que enche o Universo. Tu enches-me de uma espécie de certeza, de um marejar de sensações que confundem o meu presente com o nosso passado e com as viagens que vêm no futuro. Foi talvez a forma como te agarraste a mim no primeiro abraço dado, e como eu deixei o teu cheiro impregnar-se na minha alma já a compor tudo o que estava por vir. Naquela noite, recordo-me bem, tudo o que eu sou passou a ter um sentido exacto. Numa constante do que eu aprendi a sentir, tu conseguiste despertar-me para a realidade do que eu quero ser contigo. Depois, apostámos em experimentar as sensações dos corpos, do contacto dos poros, e sublime não é uma palavra suficiente para descrever a maravilha do que somos capazes. Eu sei, mesmo contrariado, que uma sorte assim não se constrói mas adivinha-se pela posição dos astros, como se estes fossem capazes de transformar a matéria do dito numa energia única que prevalece para além do que decidimos fazer com o entretanto das nossas vidas. Percebe o que te quero dizer: não faz mal.
Ainda e sempre teu,
Ricardo”
E saiu, optando por não carregar no “send” mas carregando na porção do after-shave e a sentir-se indeciso para o jantar marcado com a morena das pernas compridas e saltos altos.

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